De onde vem a liberdade?

José Azel

Por: José Azel - 11/09/2023


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Nós guerreamos e lutamos em defesa da liberdade. Exibimos com orgulho os documentos fundadores que formulam as nossas liberdades como direitos inalienáveis, mas de onde vem a liberdade?

Uma resposta fácil é que nossas liberdades vêm de Deus. Mas é insatisfatório porque leva a questões como: por que um Deus amoroso não permitiu que a liberdade florescesse na maior parte do Seu mundo? De acordo com o Relatório Liberdade no Mundo (Freedom House, 2019), neste mundo de 7,6 mil milhões de habitantes, apenas 39 por cento são livres, 24 por cento são parcialmente livres e os restantes 37 por cento não o são. Ou seja, 4,6 mil milhões de pessoas não são livres ou são apenas parcialmente livres.

Acreditamos que a liberdade é uma aspiração de todos os seres humanos. No entanto, a liberdade tem sido historicamente rara e continua escassa. Como Daron Acemoglu e James Robinson observaram no seu último livro The Narrow Corridor, “…não há nada de espontâneo no surgimento da liberdade, nem tem sido fácil alcançá-la na história da humanidade”.

A maioria das sociedades não conseguiu desenvolver um Estado com capacidade para fazer cumprir as leis, prestar serviços públicos e, ao mesmo tempo, permanecer sob o controlo de uma sociedade enérgica e bem organizada. Abundam os Estados poderosos, mas muitos deles usam o poder para a repressão e a dominação, e não para promover as liberdades individuais.

Um tema central na tese de Acemoglu e Robinson é que a liberdade precisa do Estado e das suas leis, mas a sociedade precisa de controlar o Estado para que este proteja e promova as liberdades individuais. “A liberdade precisa de uma sociedade mobilizada que participe na política, nos protestos e nas votações… Para que a liberdade surja e floresça, tanto o Estado como a sociedade devem ser fortes.”

A liberdade não vem do governo. Mas como é necessário ter um governo para fazer cumprir as leis, a liberdade deve surgir do equilíbrio de poder entre o governo e a sociedade.

A liberdade depende criticamente deste equilíbrio. Se a sociedade não puder influenciar as políticas estatais, o despotismo se desenvolverá.

Mas porque é que existem tantas sociedades subjugadas, incapazes de fazer valer os seus direitos e de mudar o rumo da liberdade? Outra resposta fácil seria culpar o poder repressivo que os regimes possuem. Contudo, uma explicação mais incisiva é apelar ao que os cientistas sociais chamam de “dependência da trajetória”. Em essência, a dependência da trajetória explica como as decisões que enfrentamos em qualquer circunstância são limitadas e enquadradas pelas decisões que tomamos no passado, ou pelos eventos que vivenciamos, mesmo que as circunstâncias passadas não sejam mais relevantes. É uma forma técnica de dizer “a história é importante”.

Considere este exemplo prático de dependência de caminho. Se você planeja atualizar seu software de processamento de texto ou contabilidade, o novo software deverá ser capaz de ler seus arquivos antigos. Se você não consegue fazer isso, isso não vai te ajudar. A aquisição do novo software depende do caminho anterior.

A história importa, mas a história não é destino, como pensava Marx. A história é o resultado das nossas ações e a dependência do caminho não impede que as sociedades transitem de um caminho para outro. Mas tal transição exige a mobilização da sociedade. É por isso que os governos despóticos procuram manter as suas sociedades fragmentadas e focadas em questões triviais.

A liberdade não garante que tomemos as melhores decisões para as nossas vidas, apenas nos garante que ninguém decidirá por nós. Embora as evidências mostrem que a liberdade individual é a condição necessária para o bem-estar da sociedade, não existe uma tendência natural para os governos protegerem as liberdades individuais. Como ensinou o teórico político Juan Bautista Alberdi (1810-1884): “A onipotência do Estado é a negação da liberdade individual”.

A liberdade está intimamente associada à nossa noção de direitos e requer uma sociedade civil organizada em torno da ideia de direitos individuais. Outra forma de dizer isso é que a liberdade emana de nós.


As opiniões aqui publicadas são de inteira responsabilidade de seus autores.