América Latina, o tabuleiro de xadrez da KGB

Hugo Marcelo Balderrama

Por: Hugo Marcelo Balderrama - 23/03/2025

Colunista convidado.
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O primeiro presidente pós-soviético da Rússia, Boris Yeltsin, desmantelou o sistema de controle estatal dos mercados e privatizou empresas públicas, permitindo a livre iniciativa em todo o país. Quase ao mesmo tempo, a temida KGB encerrou oficialmente suas operações, encerrando a Guerra Fria contra os Estados Unidos.

A queda da União Soviética levou muitos no Ocidente a abrir garrafas de champanhe e, muito cedo, comemorar o fim das ameaças totalitárias. Entretanto, as reformas pró-mercado de Yeltsin, nem o influxo maciço de investimentos na década de 1990, não conseguiram apagar os impulsos autoritários dos velhos nostálgicos da era comunista, incluindo Maximovich Primakov, pai da Doutrina Primakov.

Para Primakov e seu subsequente estrategista de implementação, Valery Gerasimov, era fundamental que a Rússia expandisse suas atividades na América Latina. Aquele mundo distante para eles; Porém, próximo aos Estados Unidos, tornou-se uma área de importância estratégica, pois lhes permitiu equilibrar, ou pelo menos, perturbar a hegemonia de Washington. Além do acima, a doutrina também propôs alianças com o Irã, a China e a Índia para criar um mundo multipolar.

A doação de dinheiro de Hugo Chávez para desestabilizar os governos de Sánchez de Lozada, na Bolívia, e de Jamil Mahuad, no Equador, criou o cenário perfeito para desempolvar as velhas alianças entre a esquerda latino-americana e seus camaradas russos. Sim, acredite ou não, para o Fórum de São Paulo e Putin, a Guerra Fria não havia acabado; estava apenas em espera.

As obras de pensadores militares russos, como os generais Makhmut Gareev, Vladimir Slipchenko, Sergei Bogdanov e Valery Gerasimov, fornecem uma estrutura útil para entender a estratégia da Rússia de expandir, com a ajuda de Hugo Chávez, Lula da Silva, Daniel Ortega e Fidel Castro, o confronto além da guerra convencional para um amplo espectro de atividades, que vão da desinformação à guerra cibernética, alianças com o crime transnacional e sabotagem econômica. Basicamente, era uma versão melhorada de algo que a KGB já havia proposto na década de 1960: nascia uma joint venture autoritário-criminosa (JBAC).

Embora a presença russa na região seja extensa, neste artigo vou me concentrar na Nicarágua, pois é o exemplo mais palpável do JBAC mencionado acima.

A Nicarágua, sob a ditadura de Daniel Ortega e Rosa Murillo, tornou-se um centro importante para os planos expansionistas russos, já que o país é a base de operações do seu sistema de navegação por satélite, mais conhecido como GLONASS. O país também abriga um centro de vacinação multimilionário, uma academia de polícia, um centro de treinamento e guerra cibernética no prédio de telecomunicações estatal e um prédio do Ministério do Interior, que tem o status diplomático de uma embaixada. Resumindo, Putin e seus capangas reuniram um exército inteiro no país centro-americano.

Sejamos claros: a perseguição à Igreja Católica na Nicarágua está sendo realizada usando a mais recente tecnologia de espionagem russa. A este respeito, Walter Sánchez Silva, jornalista da ACIPRENSA, explica:

A ditadura de Daniel Ortega e sua "copresidente" e esposa, Rosario Murillo, na Nicarágua continua sua perseguição à Igreja Católica e outras denominações cristãs: agora monitora padres, verifica seus celulares e exige relatórios semanais sobre suas atividades, além de restringir sua liberdade de movimento.

Por sua vez, a organização cristã internacional Christian Solidarity Worldwide (CSW) publicou um relatório em março, confirmando o que o Mosaico CSI apresentou em janeiro, que descreve as "medidas cautelares" da ditadura contra líderes religiosos, como a obrigação de apresentar relatórios semanais à polícia, compartilhar detalhes de seus planejamentos e a proibição de sair de seu município sem autorização do governo.

Para vários jornalistas nicaraguenses, o trabalho investigativo é quase um veredito, porque, como explica Luis Galeano, diretor do programa Café con voz: "O regime tem a capacidade de ver o que escrevemos e armazenamos em computadores e celulares".

Concluindo, é verdade que a KGB não existe mais, mas seus operadores e agentes continuam jogando xadrez geopolítico na América Latina.


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